13.4.05

Quem quer manter a ordem?
Quando eles estavam saindo da água, o Espírito do Senhor levou Filipe embora. O funcionário não viu mais Filipe, porém continuou sua viagem, cheio de alegria. De repente, Filipe se encontrou na cidade de Azoto e seguiu viagem, anunciando o evangelho por todas as cidades até chegar a Cesaréia.
(Atos 8. 39 - 40)

Manter a ordem é uma idéia tipicamente positivista, estando impregnada na mentalidade da igreja muitas vezes. Firmada na nossa, correta, de que a rebeldia é pecado, e numa interpretação estrita e perigosa de textos como Romanos 13. 1 – 7. Os defensores da manutenção da ordem vão sempre me dizer que Deus é o Deus da ordem. Que criar desordem é coisa do diabo. Será?
Penso que o Deus que se revela na Bíblia não é bem assim. Deus criou muitas desordens na história. Quando nasce a Igreja (relato de Atos 2), o evento pentecostal é puramente desordenado. Chegam a pensar que os discípulos estão bêbados!
Quando nasce a Reforma, outro momento de desordem. Lutero chega a ser proscrito do império. Ele é um subversivo.
Agora, não existe criação de desordem cósmica maior do que na história de uma jovem, noiva de um homem que, sem manter relações com homem algum, aparece grávida do Espírito Santo (quer dizer, do próprio Deus). Três desordens: engravidar-se sem relações; engravidar-se do próprio Deus; gerar no ventre o mesmo Deus.
A Encarnação de Cristo é a maior desordem cósmica e eterna jamais havida. Promovida pelo Deus da revolução em favor da humanidade a quem Ele ama; Ele mesmo se tornou um de nós.
Mas hoje eu estava pensando em um personagem do livro de Atos que adorava uma desordem. Filipe aparece, em primeiro lugar, no capítulo 6. De antemão, ele já é definido como alguém cheio do Espírito Santo e de sabedoria, pré-requisito para a escolha dos diáconos.
Em que ele vem a quebrar a ordem? A escolha dos diáconos atendia a um objetivo específico. Eles estavam sendo escolhidos para servir à comunidade, liberando os apóstolos para que eles sim se dedicassem à pregação. Não era o papel dos diáconos, não era o de Filipe, pregar. Eles não eram os missionários da igreja. Só que Filipe, como Estevão, não deu a mínima atenção para essa ordenação. Já no capítulo 8, vemos Filipe anunciando o evangelho em Samaria e multidões se convertiam e milagres aos montes iam acontecendo.
Depois que Pedro e João confirmam, segundo uma manutenção de ordem já caduca, o ministério de Filipe em Samaria – existe confirmação maior do que os milagres e as conversões? - , é hora de ele subverter a ordem lógica. Ministério de sucesso, Deus o tira de lá e o manda ir para o meio de uma estrada deserta. Ali, encontra um homem, funcionário da rainha da Etiópia, e prega apenas a ele. Das multidões a um homem. E depois de batizá-lo, é hora de subverter a ordem cósmica. Tempo e espaço são desordenados para esse desordenado homem cheio do Espírito: Quando eles estavam saindo da água, o Espírito do Senhor levou Filipe embora. O funcionário não viu mais Filipe, porém continuou sua viagem, cheio de alegria. De repente, Filipe se encontrou na cidade de Azoto e seguiu viagem, anunciando o evangelho por todas as cidades até chegar a Cesaréia. (At. 8. 39 - 40).
Ser cheio do Espírito Santo é se dispor, como Filipe, a viver uma vida de pura desordem. A ordem, para aquele que é guiado pelo vento que sopra onde quer, está caduca. Procurar a sua manutenção, sob qualquer desculpa, é atentar contra a ação poderosa de Deus na execução de Sua vontade.
Deus não se revelou segundo a ordem do templo na pessoa de Jesus. Desde o seu predecessor, João Batista, que pregava no deserto, fora do circuito religioso oficial, fora da ordem social estabelecida. Em Jesus, Deus promoveu a desordem cósmica por excelência. E a partir do Pentecostes, o Espírito enche a vida da Igreja e dos cristãos, não para que lutemos para manter a ordem, mas sim para que, ousadamente, vivamos uma vida de desordem que manifeste o impacto do poder utópico (isto é, crítico) do Reino de Deus entre nós.
E então: quem quer criar desordem?

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