17.5.05

Tudo dá certo

Assim também tudo o que essas pessoas fazem dá certo.
Salmo 1. 3.

Não sei exatamente o porquê, mas nos últimos dias estou com esse texto na minha cabeça e no meu coração. Como se estivesse sendo tomado por uma “ousada certeza” que nunca antes experimentei. E, claro, esse processo me forçou naturalmente a pensar no que isso deve significar para mim. O que devo entender disso?
Talvez pela minha formação teológica e intelectual eu sempre tive muita dificuldade para compreender uma passagem como essa. Se Deus é soberano, se Ele é o Senhor, e eu não passo de um servo inútil, como posso afirmar que tudo o que eu faça dará certo, será bem sucedido? Será que não posso errar meus julgamentos? Será que a vida é feita apenas de vitórias? Mas não é difícil perceber que existem condições para que a idéia do Salmo 1 possa se efetivar na vida cristã. Logo, as perguntas que devemos fazer ao texto, de início, não são as que fiz por muito tempo, estas que citei acima. O Salmo 1 não trata disso. Não questiona a Soberania de Deus. Não exalta o poder de ação do homem, nem uma possível impossibilidade de errar desse homem. O Salmo 1 não fala de uma vida de vitórias no sentido apregoado por aí, no mundo contemporâneo. Pregação que costuma esquecer que a maior vitória do universo foi conquistada no sofrimento e na morte em uma cruz. Por isso, o porquê que devemos buscar é outro.
A realidade do Salmo 1 é a comunhão e intimidade com Deus. O Salmo 1 aponta a dupla possibilidade de escolha que tem o ser humano no mundo. De um lado, a vida. Do outro, a morte. E, no mundo condenado a escolher, o homem pode optar pelo caminho feliz, de vida: a comunhão íntima com Deus, traduzida no deixar de lado o conselho dos maus, seus exemplos, sua companhia. A comunhão com Deus ainda se manifesta no prazer que este feliz passa a ter na leitura e meditação da Palavra de Deus. Vida de intimidade, de oração, de paz, de gozo.
É disso que fala o Salmo. É disso que ele fala quando nos diz que tudo o que essas pessoas fazem dá certo. Não é porque haja méritos nelas que as tornem imbatíveis. A única coisa que faz a diferença é que, agora, elas andam na intimidade do Senhor, dia a dia. E, assim, têm aprendido com Ele acerca dos desejos, dos sonhos, dos planos e dos projetos dEle em suas vidas. Tudo o que elas fazem dá certo porque seu coração se ligou de tal maneira ao do Senhor que agora tudo o que elas querem e tudo o que fazem depende de Deus, se centra na vontade dEle para a sua vida.
O único jeito que nós temos de sermos bem-sucedidos em tudo é fazermos tudo dentro do que Deus revela ser Sua vontade para nós. Isso significa que não devemos fazer nossos projetos, construir nossos planos, iniciar as nossas ações e, depois, pedir a Deus a Sua bênção para isso, esperando que, no fim, todas as coisas prosperem. Se podemos saber que todas as coisas darão certo é porque, antes mesmo de sonhá-las ou pensá-las, nosso prazer está na comunhão e intimidade com Deus. Nossa vida se rende ao Senhor e o nosso coração O busca inteiramente. Dessa maneira, esperamos no Senhor que Ele revele seus projetos, planos e ações para tudo. Esperamos que Ele nos mostre a Sua vontade, antes de darmos o primeiro passo. Não sonhamos mais os nossos sonhos sozinhos, mas desejamos ardentemente sonhar os sonhos de Deus para nós. Aguardamos, buscando a Sua face, tendo nEle o nosso prazer, fazendo dEle a nossa vida. Meditando na Sua Lei. Amando-O e andando com Ele. E, assim, não são mais os nossos planos, ou nossa vontade, ou nossa ação, mas sim os de Deus. Tudo o que fazemos dá certo porque não fazemos as nossas coisas, mas sim as de Deus. Somos, desse modo, apenas cooperadores da obra dEle no mundo e em nossas vidas. Assim também tudo o que essas pessoas fazem dá certo, porque tudo o que Deus faz dá certo.
É impossível não me lembrar agora de uma passagem de Israel no deserto. Um pouco depois do episódio do bezerro de ouro, após a purificação do pecado do povo, Moisés trava um interessante diálogo com o Senhor. É verdade que me mandaste guiar este povo para aquela terra, porém não me disseste quem é que irá comigo. Disseste que me conheces bem e que estás contente comigo. Agora, se isso é assim mesmo, fala-me dos teus planos para eu possa te servir e continuar a te agradar. Lembra que escolheste esta nação para ser tua (Ex. 33. 12 – 13). Moisés, primeiramente, pede que Deus revele que planos têm para o povo e para si mesmo, sua liderança, antes de tomar qualquer iniciativa de ação. Isso devia nos inspirar. E aí, diante da resposta do Senhor, Moisés fala palavras que deviam estar profundamente gravadas em nosso coração, em nossa mente, em nossa vida. Deus disse: - Eu irei com você e lhe darei a vitória. Então Moisés respondeu: - Se não fores com o teu povo, não nos faça sair deste lugar. (...) A tua presença é que mostrará que somos diferentes dos outros povos da terra (Ex. 33. 14 – 16).
Se tudo o que fazemos dá certo não é porque somos mais especiais que ninguém, mas sim porque, aprendendo a viver na dimensão da comunhão e intimidade com o Senhor, sonhamos os Seus sonhos, vivemos os Seus planos. Se tudo o que fazemos dá certo é porque aprendemos a conhecer a vontade de Deus e cooperamos com ela.

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