30.11.05

Não é filme

E o segundo mais importante é parecido com o primeiro: “Ame os outros como você ama a você mesmo”.
Mateus 22. 39

Esses últimos dias tenho pensado de novo sobre nossas superficialidades. Especificamente, fui conduzido a refletir sobre a forma superficial como nos relacionamos com as outras pessoas. Nossas relações não são conduzidas pela necessidade de nos conhecermos melhor, mas apenas são encaradas como formas descartáveis de “uso” das pessoas que são interessantes temporariamente aos nossos propósitos; pessoas que ficam sem serventia para nós após usadas. Penso que o pior desse processo é que nos passa de forma inconsciente: não somos capazes de refletir sobre tudo isso, por isso nos parece a única alternativa possível de vida.
Nossa superficialidade, desse modo, nos faz encarar as pessoas à nossa volta como se fossem personagens de filmes interpretados por atores. Apenas nossas vidas são reais de verdade. As pessoas à nossa volta não sentem, não sofrem, não vivem de verdade. Como se fossem esses personagens, podem ter suas vidas destruídas agora porque seus atores voltam em outras estórias, em outros filmes, contando outros finais, mais felizes, alguns anos mais tarde. Parece-me que somos capazes de magoar e machucar severamente quem está do nosso lado porque não conseguimos ver que ali está um ser humano, com uma história pessoal, com uma vida, com sentimentos, sonhos e emoções. Para nós, o nosso próximo não deve ser alguém de verdade. A vida é como um filme, então, cujo diretor sou eu, única pessoa de verdade, em função de quem todos os outros personagens existem. Podemos matar pessoas, em vários sentidos, porque para nós elas não passam de linhas escritas em algum roteiro.
E o segundo mais importante é parecido com o primeiro: “Ame os outros como você ama a você mesmo”. Dentro desse contexto, essas palavras de Jesus poderiam ser lidas como uma convocação que o Mestre nos faz a que nos lembremos que os outros, à nossa volta, são tão reais, são tão pessoas, quanto nós mesmos. É um desafio a que tiremos os nossos olhos do próprio umbigo. É um desafio a que saiamos de nós mesmos e passemos a nos importar com os que nos cercam. É um desafio a que aprofundemos a nossa vida, aprofundando nossas relações interpessoais em um nível em que nos percebamos, e ao próximo, como pessoas.
Nesse desafio, se implica um aprofundamento real de nossa relação com Deus. Porque só é possível ter uma relação de verdade com o Pai a partir do instante que temos uma relação de verdade com os próximos. Se alguém diz: “Eu amo a Deus”, mas odeia o seu irmão, é mentiroso. Pois ninguém pode amar a Deus, a quem não vê, se não amar o seu irmão, a quem vê (1 Jo. 4. 20).
Viver a vida plena de Jesus passa por ter consciência de que as pessoas à nossa volta são reais de verdade. Merecem respeito, merecem amor, merecem consideração. Viver a vida de plena de Jesus passa por aprofundar o relacionamento com o próximo. Conseqüentemente, aprofundar o relacionamento com Cristo. E usufruir toda a riqueza e inesgotável profundidade do amor que Deus manifesta por meio de Cristo.

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