12.5.15

Matar o Pai

Para a psicanálise, a partir da análise do mito do Édipo Rei, quem não matar o pai simbolicamente permanecerá infantil a vida toda. 
Lembrei-me disso na leitura da parábola do filho pródigo em Lucas:
"E Jesus disse ainda: — Um homem tinha dois filhos. Certo dia o mais moço disse ao pai: “Pai, quero que o senhor me dê agora a minha parte da herança.” — E o pai repartiu os bens entre os dois". (Lucas 15:11-12 NTLH)
Quando pede sua parte na herança do pai, o filho, simbolicamente, mata o pai. Herança é algo que é dado como testamento, após a morte. É, então, como se o filho dissesse ao pai que a partir daquele momento vai considerá-lo como morto.  Isso ajuda, na parábola, a explicar toda a relutância que o filho tem, após gastar todos os bens, para voltar à casa do pai. Aliás, isso também ajuda a explicar porque ele acha que o único papel que lhe caberia ali, no retorno, seria o de um empregado.
Mas pensemos na morte simbólica do pai como ato fundamental para que o sujeito alcance a maturidade. O pai representa a lei. Sob seu domínio, não podemos ser outra coisa que não heterônomos: ou seja, somos guiados pela lei de outro. Ser maduro, ser adulto é o mesmo que ser autônomo: ou seja, é reconhecer em si a lei, o princípio ético para a sua ação no mundo. E se responsabilizar - quer dizer, ser capaz de dar resposta - por isso.
Ai eu volto para a parábola, na qual o pai é uma figura de Deus. É preciso matar o pai. É preciso matar Deus. O filho só consegue experimentar a realidade de uma vida autônoma com Deus, uma vida plena da graça e do amor perdoador do Pai, depois que O mata, usufrui de sua herança. É nesse retorno para o Pai, já morto simbolicamente, que o filho encontra sua fé e uma nova e revigorante relação com o Pai.
Interessante também pensar que a parábola foi contada, como sabemos no início do capítulo 15 de Lucas, contra os fariseus porque estes criticavam Jesus por andar com pecadores.
Os fariseus estavam sob a Lei. Sua fé era infantilizada como a do irmão que ficou - aquele que não matara simbolicamente o pai, ou seja, a Lei. Infantis, chateiam-se enormemente contra aquele irmão que, matando o pai e vivendo dissolutamente, reecontrou-se com ele em uma nova forma de relacionamento, fundado no amor, com liberdade e autonomia, como convém a adultos.
Na minha experiência de fé tenho aprendido que, como o filho pródigo, temos de matar o Pai para encontrarmos uma nova fé madura e autônoma. Tenho encontrado muitos irmãos e irmãs que, passando pela mesma experiência, ressignificaram sua fé longe de heteronomia escravizante. Ousaram romper com a fé infantil como a dos fariseus denunciados por Jesus. 

2 comentários:

Alex Fabiano disse...

Meu amigo, a Parábola, do filho prodigo, está mais para arrependimento e libertação, da Lei de Moisés, e reconhecer o amor verdadeiro do PAI, estando o filho morto, e reconhecendo a vida com o PAI. Retornando para os seus braços, porque não somos autônomos, somos dependentes uns dos outros, ajudando-nos mutuamente.

Daniel Dantas Lemos disse...

Não exatamente, mas tb. Lembre que a parábola foi contada por Jesus contra os fariseus, como demonstra o início do capítulo, a partir do que Ele conta as estórias:

"E Chegavam-se a ele todos os publicanos e pecadores para o ouvir.
E os fariseus e os escribas murmuravam, dizendo: Este recebe pecadores, e come com eles."
Lucas 15:1,2

Desse modo, o protagonismo da história cabe ao filho que ficou, representação dos fariseus.